sábado, 15 de março de 2008

Solo

Solo a Ciegas (con lágrimas azules)
Rasgado do Público numa madrugada de sábado há cerca de 2 semanas.

"Vais ao bailado?"- a sms que me fez levantar do sofá onde adormeci toda a tarde, com a intenção primária de ler um livro.
Peguei no telefone "Já temos muito poucos bilhetes, e não fazemos reservas"
Cheguei ao local e o cenário pré-anunciado confirmou-se - "Já não há bilhetes, quer ficar em lista de espera?". O espectáculo começou e vi os últimos bilhetes desaparecerem nas mãos de pessoas que à minha frente e de todos os outros que não tiveram a mesma sorte, não se coibiram de mostrar a sua satisfação. Pena que trabalho amanhã.

Será este um "Sabor da Sandia" versão 2?? Aquele filme que não vi no festival de Barcelona em 2005, que perdi em várias salas de cinema alternativo no Porto em 2007/8? Não pelo que possam valer, mas pelo percurso da vontade, ainda não desisti (de ambos).

Depois do convite feito a diferentes personalidades, perguntei "Faz sentido ir sozinha?" "Claro que faz!" - responderam-me do outro lado da linha, na mesma linha (de pensamento) "No anonimato dessa grande cidade, é o que faz mais sentido"
Confirmei pelo número de pessoas na mesma situação.

A frustração do momento levou-me a entrar num (mais um) shopping, em busca de um livro que me desse motivação para a próxima viagem. Antes que encontrasse uma livraria (se é que existe) passei pelas bilheteiras de um cinema cuja existência desconhecia. Num impulso comprei um bilhete, com desconto de estudante, para um filme que havia começado há 15 minutos. Este país não é para velhos.
"Dois?""Um, por favor".

Solo...

Porque é que as pessoas vão ao cinema acompanhadas? Trata-se de uma actividade individual. Em tempos já tinha feito este mesmo tipo de reflexão. Foi a minha companheira de piso, H, venezuelana, acérrima defensora de idas a solo ao cinema que me convenceu a experimentar. É realmente diferente. Foi uma experiência positiva que até hoje, nem sei bem porquê não tinha repetido. A atenção e envolvência que se dedica, compensa em larga escala a falta daquele pavilhão auricular ao lado, para a partilha. Mais uma vez choquei-me com a pressa das massas de sair em vez de aproveitar os momentos finais, normalmente com uma música aconchegante. Pressionada não consegui manter-me até ao fim, mas foi melhor que nada. Nota positiva para uma sala em que imperava o silêncio durante o filme, ocasionalmente interrompido pelo casal que atrás ou ao lado, resolvia trocar uns afectos.

Solo...
"No anonimato dessa grande cidade"
Anonimato? Quando o meu porteiro, sem eu nunca ter falado com ele, ou dado abebébias para qualquer tipo de intimidade, sabe tudo sobre mim, onde a esteticista além disso ainda faz perguntas tão íntimas que nem sei se com as minhas amigas teria essa conversa, onde em cada saída encontro sempre alguém conhecido... que anonimato?
Talvez Lisboa se tenha tornado uma cidade pequena demais para mim. Mesmo sem ter conhecido ainda todos os seus recantos ou encantos.

Solo...
Sim, este Verão quis viajar sozinha. Será assim tão estranho?

Solo...
Porque bebo um café solo. Porque gosto!


Um beijinho especial àqueles com quem gosto de partilhar e que partilham comigo, apesar de todo o desejo do solo

5 comentários:

Janus disse...

Depois de ler estas palavras povoa-me a ideia de que continuas a percorrer o trilho da "fuga em frente". Quando se esgotam as descobertas, segues rumo a novas paragens, novas descobertas, novas faces...sem destino aparente?

No meio de 1.500.000 faces diferentes,almas distintas, gostos diferentes, recantos ainda por descobrir e surpresas por desvendar, não creio que Lisboa esgote os seus encantos ainda que comeces a pensar o contrário... talvez "sola" possas descobrir o que ainda te escapou por algumas das tuas energias e atenções estarem sintonizadas noutras pessoas ou pensamentos.

O conceito do cinema a solo é pertinente... solo, permite-te captar aquelas diálogos momentaneos, os grandes planos de face, as subtilezas, que por vezes nos passam despercebidas porque as palavras que o vizinho do lado nos diz nos roubam a atenção momentanea...
Mas sempre associei o cinema na sala como um momento de comunhão e o cinema em casa como o meu momento de isolamento e individualismo... por isso sou suspeito para falar...

Fui ao bailado que não conseguiste assistir, ontem... honestamente nunca gostei da Olga Mesa como coreógrafa mas nunca fui de mente fechada... mas confesso que já vi trabalhos muito melhores... quanto ao "el sabor de la sandia"... gostei bastante do filme, talvez um dos primeiros filmes ero-porno-chic com argumento,o trio dos 2 actores e do camera-M, a roçar por momentos o imperio dos sentidos...não deixa ninguém indiferente.

Neste momento só importando o dvd de Espanha ou então experimenta sacá-lo...

http://www.mininova.org/tor/352826

Quanto ao porteiro cusco e à esteticista alcoviteira... pensa que é um requisito Sine qua non de qualquer CV de porteiro ou esteticista saber os mais infimos pormenores dos seus clientes, muitos deles que já nem nós nos lembramos... E no fundo, nós sempre soubemos isso, apenas o consentimos sem pensarmos muito neles...

E que o aroma do proximo cafe a solo seja mais intenso, mais detalhado, mais perene que os que foram partilhados e que te desviaram as atenções que uma experiência a solo requere... como por exemplo um café na esplanada do Noobai café...

Casanova disse...

Ainda bem que não perdi muito ao falhar o bailado.

Interessante o teu comentário, Janus. Conhecemo-nos?

Terei muito gosto em explorar cantos e recantos de Lisboa que por falta de oportunidade, e não por distracção, ainda não conheci.

Já agora, "café solo", é o termo usado na Catalunha para café simples, expresso, puro...

vintage disse...

Gostei do termo "pavilhão auricular"! Dispensável, sobretudo se é mais que um, ao nosso lado, atrás ou à frente.
"El sabor de la Sandía": recomendável o seu visionamento, sem receios de qualquer ordem.

Para quando um "carajillo" neste lado da península?

Audições interessantes (quase diárias) no sítio do costume: www.coveremix.blogspot.com

Christian disse...

solo...fiz três inter-rail a solo e adorei...tive a oportunidade de encontrar alguem que eu andava a procura há muito tempo... a mim mesmo.
estar sozinhos é a melhor maneira para aproveitar da companhia dos outros.
parabens pelo blog
christian

Casanova disse...

Traveling through the world produces a marvelous clarity in the
judgment of men. We are all of us confined and enclosed within
ourselves, and see no farther than the end of our nose. This great
world is a mirror where we must see ourselves in order to know
ourselves. There are so many different tempers, so many different
points of view, judgments, opinions, laws and customs to teach us to
judge wisely on our own, and to teach our judgment to recognize its
imperfection and natural weakness.

Michel de Montaigne (French Philosopher and Writer. 1533-1592)